Sobre coisas da ética - Ana Obregón
A polémica está instalada em Espanha, depois de ter perdido o seu único filho, vítima de cancro, a atriz espanhola Ana Obregón, de 68 anos, anunciou que não voltará a viver sozinha pois acabou de ser mãe duma menina, fruto duma barriga de aluguer.
Não partilho a visão restrita da lei dos nossos vizinhos, onde a gestação por substituição é terminantemente ilegal, seja ela remunerada ou altruísta, por ser uma manifesta violência contra as mulheres, sobretudo para as mais indefesas em risco de pobreza.
Aproximo-me mais dos termos da lei que vigora em Portugal, em que as barrigas de aluguer só são permitidas a casais hétero ou de duas mulheres, em que estas não têm útero viável (ou outras situações clínicas que impeçam a gravidez), não podendo existir em qualquer circunstância um pagamento ou doação, nem existir subordinação económica entre a gestante e os futuros pais e/ou mães.
Nesta notícia, parece implícito que o óvulo que fecundou a mãe emprestada era da própria Ana Obregón, condição necessária para estarmos a falar duma gestação de substituição, caso contrário estaríamos perante uma mera adoção, ficando no entanto a dúvida se esta recém mamã tinha preservado ovócitos viáveis, quando ainda nada apontaria para o desfecho fatal do seu filho agora falecido, contudo, para a discussão que urge não me interessa especialmente saber se o material genético usado nesta gravidez é ou não da própria atriz.
Interessa-me mais a discussão relacionada com a ética desta gravidez de aluguer.
Quando algumas celebridades anunciaram que foram pais ou mães com recurso a uma gestação por substituição, as nossas sirenes da ética não soaram, vejam-se os casos de Cristiano Ronaldo, da empresária Paula Amorim ou mais recentemente do encenador Pedro Penim.
Fora desta discussão das barrigas de aluguer, e no contexto duma gravidez natural, quando um homem com 70 ou 80 anos anuncia que vai ser pai também não me recordo de ver parangonas nos jornais a discutir a bondade dessa paternidade tardia.
Por outro lado, não evito deixar de pensar se esta mãe em idade avançada, nalgum momento pensou que para combater o seu luto e solidão iria causar sofrimento precoce nesta criança, que necessariamente perderá a mãe numa idade em que a morte da mãe será ainda mais traumática?
A meu ver, uma gravidez de aluguer não deverá ser para combater o luto duma perda trágica de quem seguramente já não tem uma idade razoável para ser pai ou mãe, mas também tenho dúvidas que uma pessoa tenha os seus direitos diminuídos por ser mulher e não ser jovem.
Lançada a polémica, que fique a reflexão, que será, certamente, controversa.