Das coisas da ética - ter três pais
Só agora está a ser regulamentada a lei que permite a gestação por substituição, também conhecida por barriga de aluguer, a qual consente, que em casos muito excecionais e bem delimitados, um casal heterossexual, de duas mulheres homossexuais, ou uma mulher sozinha, peçam a uma outra mulher para assegurar a gestação, sendo que a mãe de aluguer tem necessariamente de ser parente próxima da mãe doadora e em caso algum pode haver lugar a compensações financeiras.
É também reconhecido o direito de arrependimento à gestante, ou seja, a mãe emprestada pode, até à data do registo do bebé, dizer que afinal não quer entregar o bebé aos pais biológicos e ficar com o bebé para si – imaginem o desgosto emocional dos pais biológicos, mas estas matérias da vida humana são sempre sensíveis e os termos da lei parecem-me adequados.
Na tão esperada proposta de regulamento, vem agora o Governo prever que, nesses casos de arrependimento, na filiação da criança no Registo Civil conste não só o nome da mãe que suportou a gravidez, mas também o nome dos pais biológicos que deram os gâmetas, ou seja, no caso destes serem um casal heterossexual a criança terá oficialmente três pais, protegendo assim os direitos destes últimos mas sobretudo os da própria criança.
O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida já veio concordar, desde que se aclare melhor quais os deveres e direitos que daí resultam para a ‘progenitura biológica’, ou seja, os pais biológicos, que ao contrário da sua expetativa vão ficar sem a guarda da criança, vão ter de sustentar o bebé ou vão ter o direito de o visitar?
Tudo isto me parece extraordinário, mas tudo isto me parece adequado, com bom senso, admito, mas assim de repente ocorre-me uma outra questão, porque carga de água um casal homossexual de duas mulheres ou uma mulher sozinha podem recorrer à gestação de substituição, com técnicas de reprodução medicamente assistida, e um casal homossexual masculino tem obrigatoriamente de ir à Ucrânia, à Colômbia ou aos EUA? Ou me está aqui a escapar alguma nuance biológica ou parece-me que temos aqui uma clara inconstitucionalidade em termos de igualdade, será que alguém me pode explicar?