Se é inquietante pensar na provável falta de alternância no panorama político nacional devido à falta de comparência do (ainda) principal partido da oposição, não será contudo menos inquietante pensar no regresso ao poder de Trump também por falta de comparência dos Democratas, pensar num segundo mandato de um velho e titubeante Biden também nos tira do sério, por isso estas notícias de que afinal o Partido Democrata ainda mexe ainda nos dá uma réstia de esperança, e sim, claro que temos saudades do casal Obama, e muitas.
Pobres Criaturas, vencedor do Leão de Ouro de Veneza e o principal opositor de Oppenheimer com as suas onze nomeações, filme meio surreal do grego Yorgos Lanthimos, tinha tudo para ser uma obra-prima, um argumento e diálogos riquíssimos, uma dimensão cromática e visual com cenários, guarda-roupa e uma fotografia deslumbrantes, atores em estado de graça (só não gostei da banda sonora, também nomeada para o óscar), no caso de nós portugueses até temos uma Lisboa recriada num conto de fadas e a nossa Carminho a cantarolar um fado, mas – que maçada, há um mas -, nalguns momentos o filme perde o ritmo e torna-se chato, enrodilha-se imenso na sofisticação cénica e a coisa não desenvolve, começa de forma fulgurante, acaba em boa forma, mas pelo meio um cuidado excessivo com a finesse e o requinte visual torna-se maçador, Pobres Criaturas tinha tudo para ser um grande grande filme, falhou por um triz.
Emma Stone pode muito bem derrotar a favorita Lily Gladstone na corrida dos prémios (têm estado muito taco a taco) – sendo ambas magistrais e as nomeações justíssimas não será por elas que estarei a torcer -, e não haja qualquer dúvida que Stone, a alma do filme e cheia de cambiantes, é verdadeiramente sublime na sua Bella Baxter.
Voltando ao tema do equal pay no desporto, será mesmo justo um espetador de um jogo da final do Aberto de ténis feminino da Austrália, despachado em 1h17m e com uma qualidade sofrível entre a bielorussa Arina Sabalenka e a chinesa Zheng, pagar o mesmo que o espetador que assistiu à final masculina, entre o italiano Sinner e o russo Medvedev, que em 5 sets de pura adrenalina jogaram o triplo do tempo (3h44m)? A mim parece-me que não, e se não, será mesmo justo o Prize Money ser igual para Os e As vencedoras?
A elegância dos Best Youth, duo do Porto, ali algures entre a sweet pop eletrónica e o indie rock, regressou com novo algum, Everywhen, que bálsamo, aqui com Back With a Bang.
Durante aproximadamente uma hora ri-me a bom rir, as lágrimas escorreram de tanto rir, que é o mesmo que dizer que para mim À PROCURA DE CHAPLIN foi espetacular.
A encenadora Rita Calçada Bastos procura mostrar-nos o risível da vida, a sua brevidade e estupidez e que é sempre preferível o sorriso, a procura do seu lado solar, a urgência que lhe devemos imprimir, a sua constante procura, sempre a procura, e num divertidíssimo universo clown, que não é o mesmo que apalhaçado, vamos atrás de um mundo de Chaplin que encontra sempre a comédia na tragédia, com a sua imagética dos movimentos espelhados e miméticos, o chapéu, o balde, a vassoura, leva-nos atrás do sonho, sempre o sonho, e o riso, sempre o riso, a gargalhada.
Num espetáculo sem texto ou palavras, apenas umas algavariadas que mal se percebem, Carla Maciel brilha com o brilho das grandes estrelas que é o seu, mas Luciano Amarelo, c’os diabos, um clown que nos leva a todo o lado, uma expressividade, um magnetismo, uma sensibilidade à flor da pele, e, sobretudo, uma facilidade enorme em despertar sorrisos.
Belíssimo espetáculo, ainda em cena no Teatro São Luiz, Lisboa.
Falta-me ver o último episódio da sexta e última temporada de The Crown, quando o vir será o fim desta série absolutamente memorável, das melhores de sempre, restar-me-á apenas o prazer de poder revê-la muitas vezes.
The Crown é antes demais um tratado de história e de cidadania, devia ser estudada nas escolas, o que todos nós aprendemos sobre esta democracia absolutamente fundadora das nossas democracias ocidentais, apesar do tom cor-de-rosa que são as vidas dos príncipes e princesas, na minha opinião, oferecendo-nos também esse lado faustoso das festas, salões e mexericos, The Crown foi antes de tudo uma aula de história, sobretudo da britânica mas não só, sem descurar este lado mais voyeurístico, que quase todos nós temos, de nos deixar entrar na família real e assim aumentarmos um pouco mais os créditos de simpatia que Isabel II já nos merecia.
Se tudo em The Crown roça a perfeição, os cenários, a música, o genérico, os candelabros, toda a pompa, há algo que é francamente estarrecedor, o imenso comboio de atores geniais, consagrados, conhecidos, em ascensão ou ilustres desconhecidos, algo nunca visto, diria eu.
Esta última temporada saiu um pouco fora de pé, deixou um pouco de lado o rigor histórico das temporadas anteriores (apesar dos créditos não nos deixarem esquecer que os factos são apenas levemente inspirados em factos reais) e enveredou mais pelo lado gossip, da suposição, do que se imagina, da fantasia, dos sonhos, e isso causou-me alguma estranheza e resistência, mas por outro lado construiu nas entrelinhas várias camadas para nós próprios reconstituirmos a história que mais nos convém – esta cena, em que logo após a sua morte Diana aparece como fantasma ao príncipe Carlos, é bem exemplo disso, e é uma das minhas cenas preferidas de todas as temporadas, a fragilidade, o desamparo, a graça, a subtileza da dor que Dominic Charles West e Elizabeth Diana Debicki nos oferecem é qualquer coisa de outro mundo (Debicki é mesmo uma das rainhas maiores do cinema).
Absolutamente impactante a nova campanha da IKEA inspirada na situação política nacional, com uma argúcia e um sentido de humor apuradíssimos, e que em pouquíssimas horas se tornou viral, tendo desencadeado não só uma reação publicitária imediata de várias outras marcas (FNAC, O Gato Preto, Moviflor, Staples, etc.), como também uma proliferação de memes nas redes sociais (como o da foto), que não sendo da lavra criativa da Ikea pôs todo um país a falar da marca e a brincar com as façanhas políticas e desportivas da atualiadade. Bravo!
A Polícia Judiciária e o Ministério Público realizaram hoje mais de 50 buscas na ilha da Madeira por suspeitas de corrupção - porque é que quem conhece a cidade do Funchal não fica nada, mesmo nada, surpreendido com esta notícia?
2023 foi um excelente ano para o cinema, não só por termos tido grandes filmes, mas também por as audiências em sala terem tido um boost fantástico, devemos esse sucesso não só aos blockbusters mas também a bons filmes comerciais, louve-se este regresso às salas porque o cinema não sobrevive se nos cingirmos apenas ao conforto do streaming em casa.
Mesmo naqueles filmes que pouco me entusiasmaram ou que gostei moderadamente – Oppenheimer, Napoleon, The Killer, Barbie, Henry Sugar -, reconheço aspetos de elevada qualidade, mas 2023 foi mesmo um ano excecional e com proveniência nas mais diversas geografias, encontramos filmes maravilhosos não só nos países anglo-saxónicos como também na Alemanha, França, Espanha, Japão, Itália, Bélgica, Tunísia, Turquia, Finlândia, e também Portugal, que grande colheita para os nossos filmes lusos (nomeando apenas três, Great Yarmouth, Mal Viver/Viver Mal, Légua) .
Os Óscares não são nenhum selo de qualidade, não são nenhum certificado que um filme é bom ou mau, a lista de obras-primas nunca premiadas é extensa, são apenas uma festa glamourosa que encanta as gentes do cinema, é apenas brilho, mas ficamos sempre satisfeitos quando vemos os nossos preferidos entre os nomeados, mesmo que depois eles percam todas as estatuetas, como têm perdido sempre nestes últimos anos e este ano parece provável que volte a acontecer, e se alguns dos meus favoritos foram olimpicamente ignorados (O Sol da Meia Noite; The Old Oak; All of Us Strangers), encontro entre os nomeados a maioria dos filmes que já vi entusiasticamente (Maestro; Vidas Passadas; Dias Perfeitos; Assassinos da Lua das Flores; May December) ou que ainda aguardo ansiosamente (A Zona de Interesse; Anatomia de uma Queda; Pobres Criaturas; The Holdovers) – como tenho vários favoritos resta-me então torcer por uma surpresa e que Oppenheimer não ganhe as 13 nomeações que levou para casa.
Posso ouvir isto horas a fio, a voz celestial de Sinnead, a de Shane cheia de sombras, nesta música terrivelmente romântica e meio perseguida, Haunted, dois enormes artistas, irlandeses, também eles algo sombrios e perseguidos, provavelmente também terrivelmente românticos. Curvo-me perante as suas memórias, descansem em paz.
You got a way of walking You got a way of talking And there's something about you And now I know I never ever Want to be without you