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BURRO VELHO

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04
Fev25

Dos filmes que adoramos - Maria, de Pablo Larraín

BURRO VELHO

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Gosto muito do realizador chileno Pablo Larraín e sempre tive uma embirração solene com Angelina Jolie, sempre a vi como uma atriz mediana, para ser simpático e não dizer sofrível.

Nas cenas em que Callas tenta regressar aos palcos é a própria Jolie que canta, teve aulas intensivas de canto durante vários meses, mas naquelas no auge da Diva é Callas quem ouvimos, Jolie faz playback, e estas cenas são confrangedoras, são terríveis, patetas, a vontade que dá é desistir logo ali de ver o filme.

Feito o disclaimer inicial e dito isto, e se conseguirmos sobreviver aos vários playbacks que vão acontecendo, MARIA é uma obra-prima, fiquei totalmente rendido.

Larraín filma a última semana de vida da grande diva da ópera, em que o mundo ainda aguardava para ver se alguma vez iria regressar aos palcos, nesses dias em que Callas já se transcendia ela própria numa outra dimensão, algures entre a tragédia e a religiosidade, quando começas a querer partir mas ainda te vais agarrando ao que podes, entre o delírio e doença, quando ainda carregas o porte altivo mas já és só alguém assustado e cuidador, uma despedida intimista e cheia de humanidade de Callas, a verdadeira diva, outrora e ainda, mau-feitio.

Angelina Jolie, magérrima, noutra personagem e com outro realizador ia parecer igual a ela própria, com cara de quem comeu e não gostou, mas aqui encarna a transcendência de Maria Callas de forma sublime, aquele langor arrastado dá-lhe uma aura mística que paira sobre tudo e todos.

Sem esquecer a amorosa dupla mordomo/governanta, com a minha Alba Rohrwacher, o filme é todo um primor de requinte, a direção de arte é notável, tal como o luxuoso guarda-roupa e a belíssima fotografia, justamente nomeada para o óscar (única nomeação).

 

28
Jan25

Dos filmes que amamos - O Brutalista, de Brady Corbet

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O Brutalista foi certamente o filme com maior duração que vá vi em cinema, e é numa sala de cinema que deve ser visto, três horas e quarenta minutos, incluindo quinze minutos de intervalo, mas para o espetador que gosta de cinema o tempo não passará a correr, porque o realizador dá-nos tempo para apreciar a evolução da narrativa e a estética do filme, mas não dará certamente pelo tempo a passar.

Brady Corbet filma a história de um jovem arquiteto húngaro que chega a Nova Iorque, nos anos 50, depois de ter sobrevivido ao holocausto, história essa com várias dimensões, a do resgatar dos fantasmas do passado, a do reencontro da família, a do sentimento de rejeição dos americanos a quem chega de fora, a do mecenas que quer fazer bonito à custa da arte, ou a do artista que não sabe bem até que ponto se tem de sujeitar para fazer valer a sua arte, tudo isto com uma estética muito minimalista, da simplicidade dos materiais em bruto, da beleza do cru, do brutalismo, precisamente, do concreto, do aço, do mármore, com cenas de pura exaltação como aquela em que se negoceia mármore em Carrara ou se explica os efeitos da luz solar no altar, é tudo muito depurado.

A força dramática do filme é subliminar, está implícita sem ser preciso explica-la, está lá, sente-se, a cena em que Felicity Jones interrompe o jantar da família Van Buren é prodigiosa, mas se a dor e a tragédia são presentes, há que não deixar parecer que são vitoriosas, sempre a dignidade de quem se reergue, muito própria de uma personagem que escapou aos nazis e agora procura afirmar-se numa comunidade que não o quer, tolera-o apenas, faltando para alguns espetadores, admito, momentos de maior galvanização, que nos agarre pelas emoções, mas O Brutalista é de uma enorme força dramática, o medo, o horror, a impotência, o abuso, o antissemitismo, a determinação, a sobrevivência, a superação, a proteção de quem gostamos, o amor aos nossos, faltará talvez um momento de catarse, mas a emoção está impregnada desde a primeira cena do filme.

Ainda não estou certo que venha a torcer por este filme na noite dos Óscares, provavelmente, O Brutalista é seguramente um dos melhores filmes dos últimos anos, mas por quem irei torcer certamente – e ainda me falta ver o filme sobre o Bob Dylan – é por Adrian Brody, a sua interpretação tem um espetro infinito, ele vagueia perdido na dor, a seguir é um poço de energia a contagiar quem o ouve, ele é um farrapo humano em degradação e a seguir é um sedutor, ele é alguém que apenas sobrevive, aqueles olhos são tudo, absolutamente gigante Adrian Brody.

 

23
Jan25

Dos filmes que amamos - Ainda Estou Aqui, de Walter Salles

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Numa noite durante a semana, a sala em que vi AINDA ESTOU AQUI estava repleta, um silêncio sepulcral de comoção, mais de 200 pessoas em comunhão com um recordar coletivo dos perigos que todos vivemos num regime totalitário, AINDA ESTOU AQUI é claramente um filme político que se impõe mais do que nunca.

A alegria funcional da família Paiva no início soa a genuína, aquelas personagens parecem de carne e osso, nós aspiramos a ser como aquelas personagens, invejamos aquelas personagens, e num ápice tudo se desmorona, num ápice a vida troca-nos as voltas, mas há quem consiga contrapor à tragédia a nobreza e a coragem.

A memória histórica de um país é fortíssima neste filme de Walter Salles, mas é a intimidade duma família que nos arrasta consigo, no seu jogo de cumplicidades e de demonstrações sucessivas de amor, nas emoções que vivemos quase em família, e esta experiência em cinema é fortíssima, é grande cinema.

Não há como não destacar Fernanda Torres, um prodígio assombroso de representação, poder vê-la mais logo de fora das nomeações aos Óscares em favor de interpretações como as de Demi Moore, Karla Sofía Gascón ou Cynthia Erivo seria um ultraje. Saravá Nanda, saravá!

Que maravilha.

 

17
Jan25

Dos filmes que adoramos - A Verdadeira Dor, de Jesse Eisenberg

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Há filmes entendidos como menores que são absolutamente maiores, que delícia esta comédia dramática que junta dois primos improváveis numa viagem de homenagem à avó de quem tanto gostavam, numa descoberta das suas origens e confronto com as consequências do holocausto.

O realizador e ator Jesse Eisenberg é notável, num registo muito Woody Allenniano, ansioso, sem aptidões sociais e carregado de humor sarcástico, mas o primo Kieran Kulkin é gigante e, se dúvidas houvesse com o seu Roman Roy de Succession, o homem já está no olimpo dos atores, que carisma, enorme nesta personagem muito divertida e de grande delicadeza, que vai de um extremo ao outro das emoções com uma subtileza insuperável, podemos estar a fazer rir uma audiência para esconder uma vulnerabilidade ao ponto de só querermos morrer, podemos ser os palhaços de que todos gostam só para fazermos o nosso luto ou suprirmos a falta de atenção de quem gostamos.

A Real Pain pode parecer leve e tonto, mas transborda emoção, gostei mesmo muito. E venha o Oscar para o senhor Kulkin.

 

16
Jan25

Dos filmes de que gosto - Juror #2, de Clint Eastwood

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Há certas coisas que custam a aceitar aos apreciadores de cinema, Clint Eastwood é um dos grandes mestres, realizador de uma vastíssima filmografia, com títulos como Million Dollar Baby, A Mula, Imperdoável ou As Pontes de Madison County, à beira de completar 95 anos, talvez o realizador mais velho em ação, e aquele que será provavelmente o seu último filme não teve estreia nas salas, saltou diretamente para o streaming, que lástima não lhe podermos prestar essa homenagem.

The Juror #2, é um clássico dos filmes de tribunal, com o tom certo, no ritmo certo, uma excelente direção de atores (Toni Collette sempre brilhante) e uma importante reflexão sobre o sistema jurídico norte-americano, só coisas boas, que bela despedida se for o caso.

Uma longa vida Clint, bravo!

Na Max. 

 

15
Jan25

Dos filmes que vejo - Nosferatu

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Apesar de ter gostado do Drácula do Coppola, essa foi a exceção que confirma a regra, não gosto de filmes de terror, mais concretamente de terror gótico, e muito raramente vejo, não por me assustar, apenas porque acho sempre tudo muito chato e sem graça nenhuma.

Feita esta ressalva, quis ver este Nosferatu de Robert Eggers, inspirado no mesmíssimo Drácula de Bram Stoker, para poder ter os meus favoritos nesta temporada de prémios, sim, Nosferatu é um fortíssimo candidato a muitas das categorias técnicas, estando também a ganhar vários prémios nalgumas categorias principais, como realização e atriz principal.

Não sendo fã do género, reconheço muitas virtudes no filme, lá está, naquelas coisas mais técnicas como as roupas e os cenários, e a luz, lindíssima aquela luz, escura, sombria, mas é tudo muito chato, um bocejo que nem as cenas para assustar me espevitaram.

Lily-Rose Depp nas listas das melhores atrizes do ano? A moça não é só uma cara bonita filha de pais famosos, não está propriamente mal, mas tem a mesma cara de quem comeu e não gostou do princípio ao fim, não há ali nenhuma nuance, poupem-me.

 

14
Jan25

Dos filmes que vejo - Wicked

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Não posso dizer que é um grande musical porque as canções são um bocado frouxas, monocórdicas, mas é um filme muito bem feito, tudo o que é técnico é notável, os efeitos visuais, a fotografia, os cenários, a maquilhagem, as coreografias frenéticas, o uso da cor, sempre muita cor, muita cor mesmo, e tem frases muito bonitas sobre o direito à diferença e o dever de proteger os animais, tudo impecável, mas é só um filme infantil, OK?

Sério candidato a melhor filme do ano? Óscares para Cynthia Erivo ou Ariana Grande? Esqueçam lá isso.

Mas levem as vossas crianças que é bem bonito.

 

09
Jan25

Dos filmes que adoramos - Tudo o que Imaginamos como Luz

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Tudo o que Imaginamos como Luz, filme da realizadora indiana Payal Kapadia, é um tratado de beleza e sensibilidade, com tanto de poesia, como de política, ao acompanhar três enfermeiras de gerações diferentes, em Mumbai, que reivindicam a sua liberdade, a sua individualidade, o seu direito a serem pessoas independentes e donas das suas decisões - All We Imagine as Light é um profundo documentário da India remediada e também é uma bela história de amor.

Numa sociedade muito marcada pelo preconceito das castas e da religião, que não está habituada a dizer “amo-te”, estas três mulheres conquistam uma cumplicidade em que todos os gestos, silêncios e omissões são formas delicadas de amor, de um jeito sofrido mas sempre com nobreza de carácter, em que a luz do título do filme tanto pode ser uma luz mais onírica, como será sobretudo a luz que dá cor ao filme, o azulado da chuva das monções na cidade, ou o verde e vermelho da aldeia no interior, que fotografia tão bonita esta. E a banda sonora de Topshe? Saímos da sala com ela no ouvido, saímos da sala com a India e estas personagens a ficarem connosco.

Quem só aprecia filmes frenéticos com muita ação, ignore este filme, mas Tudo o Que Imaginamos como Luz vai ser certamente um dos filmes mais bonitos do ano.

 

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