Dos filmes de que eu gosto - Saint Omer
A estreante, em ficção, realizadora francesa Alice Diop, ela própria descendente de imigrantes senegaleses e consagrada por fazer documentários, muitos deles sobre imigrantes nos banlieu parisienses, fez este filme-quase documentário baseado no julgamento verídico de uma imigrante senegalesa, julgamento esse que a própria Diop assistiu e que há alguns anos terá, compreensivelmente, agitado as terras de França, afinal uma mãe tinha matado a sua própria bebé.
O filme passa-se, nas suas quase duas, horas dentro do tribunal - alguns dos diálogos são transcrições literais do que foi efetivamente lá dito - e duma forma serena, mas ao mesmo tempo emocionalmente muito forte, e sem nos explicar tudo, fala-nos da monstruosidade sem explicação que existe dentro do ser humano, da necessidade de procurarmos compreender antes de uma condenação sumária, fala-nos dos mistérios e dos medos da maternidade, da saúde mental e de bruxarias (sorcelleries, aprendi esta palavra), fala-nos do quão difícil é ser imigrante e do racismo fortemente enraizado (pasme-se que a jovem fala irrepreensivelmente francês e, ousadia a sua, enquanto estudante de filosofia decidiu estudar o filósofo austríaco Wittengstein, que nada tem a ver com as suas origens), fala-nos sobretudo da compaixão e da empatia humana de que tanto precisamos.
Nota para as muito sólidas personagens secundárias, mas impossível não destacar as atrizes principais (incluindo as notáveis juíza e advogada de defesa, mulheres).