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BURRO VELHO

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01
Jul23

Dos meus filmes - Légua

BURRO VELHO

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Pelo amor da santa, procurem uma sala de cinema (estreou em 12 cidades) e vão rapidamente ver LÉGUA, da dupla de realizadores Filipa Reis e João Miller Guerra.

Nesta história de três gerações de mulheres do norte de Portugal, de mulheres fortes que sabem decidir por si, inspirada em pessoas e lugares reais, precisamente em Légua, a meio do caminho entre o Marco de Canavezes e Amarante, cruzam-se muitas histórias e muitas camadas, histórias de cuidar, de abnegação, da forma muito honrada de ser e sentir das gentes nortenhas, da dignidade do trabalho, sempre histórias de amor.

É um filme de solidariedade e camaradagem, de respeitar o vagar da natureza e o tempo da vida, é um filme de pureza, onde as coisas são simples, são o que são, sem mágoas e revoltas, com alegria até, mas sempre com uma tristeza entranhada, funda, mas daquela tristeza que não nos consome.

Légua também é um finíssimo retrato sociológico, duma naturalidade, dum respeito imenso por aquelas pessoas – os atores são praticamente todos não profissionais, são pessoas dali -, que coisa boa vê-los a assentar cimento, a encher a carrinha de bacalhau e azeite para voltarem a França, ou, naquela que é talvez a minha cena preferida, o almoço de aniversário naquela cave por rebocar ao pé da garrafeira, não descurando uma forte mensagem política, que a sociedade tem de cuidar de quem cuida, do cuidador informal.

Ah, tenho de falar do sotaque e do jeito de falar, que vem de dentro, que encantamento ouvir frases como ‘então Milinha, a Lu beio do Marco prá pôr bonita’.

Sobre a mãe Carla Maciel falarei depois, deixem-me elogiar a jovem estudante de teatro, que faz de filha, Vitória Nogueira da Silva, e sobretudo Fátima Soares, que interpreta a personagem idosa, uma senhora que frequentava umas aulas de teatro na Universidade Sénior do Marco e que depois de passar por uns castings nos entrega esta Milinha, uau, como é possível minha nossa senhora?

No genérico final ouvimos Amor e Água Fresca da nossa saudosa Dina e nem um cabelo se mexe entre a assistência, assim que termina a canção (a meio do genérico) irrompe uma enorme salva de palmas de alegria e comoção pelo filme que todos tínhamos acabado de ver, e da minha parte também de homenagem à Dina. Foi bonito.

 

26
Mai23

Dos filmes de que gosto - Mal Viver + Viver Mal

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MalViver

vivermal

 

Canijo fez dois filmes baseados numa ideia que tem lá no seu íntimo, que as mães atrofiam os filhos, sobretudo as filhas, e por sua vez estas atrofiam as suas filhas, netas das primeiras, mães eucalipto, que secam tudo à sua volta e deixam as filhas áridas, inseguras, ansiosas, filhas que não recebem amor e que depois nada têm para dar como mães, até podem tentar mas não sabem como.

Este retrato desencantado e agreste da maternidade não é fofo, é agressivo, trágico até, mas são quatro horas de grande mestria (para quem, como eu, os viu de seguida), de diálogos, vidas, conversas sempre cruzadas, onde no meio de tanta dureza ainda conseguimos nos rir com o absurdo da vida.

O filme é rodado na íntegra num hotel em Ofir, e só o hotel é só por si uma personagem, aquele ambiente tão anos 70, os quartos, a piscina, os balneários, o restaurante, a sala de tv, personagem muito valorizada pela luz do filme, sombria e negra no ‘Mal Viver’, solarenga no ‘Viver Mal’ (excelente trabalho da Leonor Teles), mas as personagens de pele e osso são insuperáveis, qualquer coisa, e se a Anabela Moreira é das minhas atrizes rainha, tal como Rita Blanco, apetecia-me destacar a Cleia Almeida de quem gosto imenso e acho muito subvalorizada, mas depois como não bater palmas à Leonor Silveira, ou à talvez melhor de todas Beatriz Batarda, todas umas megeras, todas chanfradas dos cornos, todas maravilhosas (tal como a Vera Barreto, Madalena Almeida, Filipa Areosa, Lia Carvalho, Carolina Amaral e Nuno Lopes).

Talvez o meu Canijo preferido continue a ser ‘Sangue do meu Sangue’, mas ‘Viver Mal’ e ‘Mal Viver’, premiado no Festival de Cinema de Berlim deste ano, são um prodigioso jogo de espelhos saltitando entre os dois filmes, absolutamente fantásticos.

E para quem anda distraído, ouçam com atenção o que a Piedade (Anabela Moreira) diz às hóspedes sobre os vinhos de Portalegre, mais concretamente da Serra de São Mamede, vinhos alentejanos de altitude, de um Alentejo diferente, depois não digam que não vos avisei.

 

22
Mai23

Das coisas do cinema - Prémios Sophia

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AlmaViva

 

Um dos meus filmes favoritos de 2022, ALMA VIVA, da luso-francesa Cristèle Alves Meira, arrecadou esta noite seis prémios Sophia, da Academia Portuguesa de Cinema, nomeadamente o de melhor filme, argumento original, atrizes e fotografia.

Recupero aqui o que na altura escrevi sobre o filme.  

Nunca vivi na aldeia mas venho e sou da aldeia, e apesar de longe deste interior transmontano reconheço tudo o que se passa neste Alma Viva, a aspereza dos campos, o linguajar, o asneiredo, as crendices e as mézinhas, as crianças no mundo dos adultos, as casas pobres e descuidadas, as cozinhas, os anexos e os galinheiros, os enterros e o esperar dos mortos que os filhos chegassem de fora, os emigrantes que vinham a falar françoguês nos seus bons carros com alegria na chegada e tristeza na partida, tudo isto que é estranho à cidade e aos da cidade é familiar a quem tem raízes na província, por isso, percebo que haja quem entenda que este filme não tem grande história, para mim respira vida e Portugalidade, com uma Ana Padrão fulgurante (os restantes atores, maioritariamente, amadores super convincentes). De alma cheia.

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