Da atualidade internacional – o relatório Draghi e o declínio da Europa
Mário Draghi divulgou o seu relatório de 400 páginas, encomendado pela Comissão Europeia, sobre o futuro da competitividade europeia, e o sentimento que fica depois de lermos os resultados é que mais vale fechar as portas e zarparmos rapidamente para outro continente, tal a negritude com que pinta a realidade.
A Europa continua a ter muita riqueza acumulada, mas perdeu o comboio a gerar riqueza, que é mais ou menos o mesmo que dizer que estamos a viver acima das nossas possibilidades e que todas as regalias do estado social, de que tanto nos orgulhamos, estão seriamente postas em causa.
Os números são muitos, por exemplo, em 1990, os 12 países da CEE produziam 27% da riqueza mundial, hoje os 27 países da UE produzem apenas 16%. Antes eramos donos de mais de ¼ do produto mundial, hoje de apenas 1/7, com os EUA a manter a liderança e a China a galgar terreno.
Desde a década de 90, com o surgimento da internet e da primeira revolução digital, que a Europa tem estado a marcar passo e a viver dos seus feitos no passado, se virmos quais eram as empresas mais fortes na Europa há 20 anos, são as mesmas de hoje, quase todas do setor automóvel, enquanto aquelas que o são hoje do outro lado do Atlântico simplesmente não existiam nessa altura, e isto explica-se pelos níveis de investimento em I&D totalmente desfasados entre o que se pratica na América e na Europa.
Agora que estamos a iniciar a segunda revolução digital com a Inteligência Artificial, as diferenças acentuam-se cada vez mais, e enquanto a América investe, inova, cresce e enriquece, a Europa, que todos aos anos perde 2 milhões de trabalhadores, concentra-se em expulsar imigrantes, consumindo cada vez menos, produzindo cada vez menos, crescendo cada vez menos, e empobrecendo cada vez mais, conseguindo ainda empurrar para os EUA aqueles que ousam em inovar (30% dos unicórnios nascidos na Europa desde 2021 terão emigrado para os EUA).
A principal causa desta clivagem são os diferentes níveis de investimento, quer público, quer privado, sendo que enquanto a mentalidade europeia insistir exclusivamente no financiamento bancário para financiar a sua economia temos um problema, muito agravado pela qualidade desse mesmo investimento - quando aproveitamos o PPR para gastos correntes e dar umas formaçõezinhas e desperdiçamos a oportunidade para transformar a economia, não há maneira de aprendermos, hélas!
Em jeito de resumo, o caminho único que Draghi aponta é uma maior integração europeia, com políticas orçamentais, fiscais e energéticas alinhadas (para quando a ligação elétrica da Península Ibérica a França), com uma mão-de-obra renovada (não só de massa cinzenta, mas também com mãos para trabalhar), com acesso a outras fontes de financiamento, focada no investimento e com uma transição climática com metas menos exigentes e mais alinhada com os outros blocos mundiais, ou seja, exatamente o oposto da agenda dos governos frágeis e extremistas que proliferam pela Europa fora, e com populações cada vez mais em ponto de rebuçado, está bonito está.
Às vezes até um otimista vacila, e como alguém disse um dia, a América inova, a China copia e a Europa regula, estamos no bom caminho.