Dos vetos presidenciais - Lei da Eutanásia
O direito à vida consagrado na Constituição não significa que um indivíduo deve ser obrigado a viver contra a sua vontade, esta decisão deve ser estritamente do foro das nossas liberdades individuais, a decisão de não querer continuar a viver é um direito inalienável de cada um de nós, em nada compromete os direitos de terceiros e o Estado não devia coartar ou proibir o direito de cada um.
Não compro de todo o argumento que ao aprovar esta lei o governo vai demitir-se de procurar assegurar uma rede de cuidados paliativos digna e abrangente, não acho de todo que uma coisa tenha a ver com a outra.
Estamos a falar duma matéria complexa e que não pode ser discutida com leviandade, mas na minha opinião a atual redação da proposta de lei é muito equilibrada, verificada a incurabilidade da doença ou lesão e o sofrimento de grande intensidade sentido como insuportável, o suicídio assistido só não acontecerá nos casos em o doente já não o consegue fazer pelos seus próprios meios, que é como quem diz em termos muito grosseiros pressionar a seringa com os fármacos, sendo que em caso algum nenhum profissional de saúde será chamado a garantir a morte medicamente assistida se isso violar a sua ética e consciência.
Mas se a minha forma de pensar pouco releva, já o pensamento pessoal de Marcelo é central neste processo, se dúvidas houvesse ficou claro que Marcelo não quer ser associado ao presidente que aprovou a lei da eutanásia, a sua consciência e a sua fé católica impede-o, e parecendo óbvio que o Tribunal Constitucional não levantará dúvidas sobre a promulgação da lei, restou a Marcelo este veto político para salvar a sua face.
Não resulta claro para mim que um bom católico seja à priori contrário à proposta de lei, não me parece que um bom católico se sinta pecador por atribuir esse direito a outrem, mas ainda resulta menos claro para mim que este seja mais um dos temas fraturantes esquerda-direita, discordo em absoluto, mas é facto que há uma larga maioria parlamentar a favor da aprovação da lei.
Esgotado o trunfo constitucional não é o veto presidencial suficiente para travar a lei, e à quarta tentativa veio essa maioria parlamentar afirmar “assim como sempre respeitámos uma e outra e outra e outra vez o Tribunal Constitucional e Presidente da República, chegou a vez de ser respeitada a vontade do Parlamento”, e quanto a mim afirmou muito bem.